quarta-feira, abril 11, 2012

geração rivotril.

precisava reagir. saía e o mundo parecia seu inimigo. uma folha de outono caída no chão representava toda sua dor e perdas momentâneas. e agora? virar a esquina, ralar um pouco do braço na parede (afinal, é preciso sentir) e seguir em frente.
é quase manhã-madrugada, algumas pessoas aprendendo a dirigir nos carros da auto-escola, aprendendo que é preciso ir sempre em frente sempre em frente. opa, sinal vermelho. uma parada pra fumar um cigarro e nada mais.
o que é necessário saber pra viver? respirar, estudar, ganhar dinheiro. fazer amigos, perder pessoas, chorar na madrugada, amanhecer na ressaca. estava enjoada. enjoada. enjoada. parou pra vomitar o que tinha no estômago: um vazio crescente. meu deus, é possível o vazio ser maior do que o que temos, do que o que existimos? é.

- luiza, não tô me sentindo bem...
- que foi?
- é um mal-estar no mundo

pra isso não tem remédio, meu amor. você pode tomar quantas pílulas te enfiarem goela abaixo que vai continuar ardendo, doendo ou simplesmente estar dormente. quer uma cama pra deitar? pensar sobre as coisas? sobre a vida, sabe, o amor, a morte, essas coisas.
não, não quero nada disso. quero acordar e perceber que isso na verdade é um sonho. um pesadelo que durou dias, anos, uma vida inteira. me salva, luiza? você pode segurar minha mão por um momento, sentir o que estou sentindo? essa gosma que escorre do meu corpo sem pedir permissão, dando luz a coisas que nem sei definir.

quando virou a esquina, um sol já nascia tecendo uma colcha imensa chamada aurora. vamos costurar comigo essa colcha, ô luiza. não tô dizendo que quero me distrair, mas de repente posso fazê-la de rede pra descansar ou de jangada quando me jogar finalmente no mar.

terça-feira, abril 10, 2012

sinto muito

o século XXI está me engolindo. os carros correndo, os ônibus super-lotados, os tiros da polícia na favela, a vida em via crucis. há algo que não estou suportando. eu sou fraca? sozinha? parece que minha mente é um labirinto imenso cheio de cadeados. onde estão as chaves? eu não sei. as passagens? trancafiadas. nem sei para onde estou indo, mas sei que caminho...
eu, passageira de mim, agora na chuva. os respingos parecem cinzas de um cigarro velho, nem mesmo a fumaça encosta mais nos poros. a tinta vermelha dos cabelos escorre pelo corpo, parece sangue, mas não é. esse está na veia, também preso e querendo escapulir para o mundo.
os dedos nervosos pedem socorro. o que vou escrever? sobre a anestesia? sobre eu estar em constante cirurgia? engulo as pílulas como quem pede para morrer mais rápido. por favor, uma solução um arrependimento onde ficaram aqueles sorrisos? na rede balançando no quintal? nos pés cheios de lama correndo pela rua?
eu queria... deixa eu ver, pensar bem, queria não estar com a mente num náufrago. parece que há água saindo de meus ouvidos, de meu nariz, de meus olhos. e a boca presa pedindo pelo amor de deus para gritar e respirar um bocado desse céu estrelado que agora me guarda da chuva.
a casa é uma prisão. não posso dizer que quero morrer, é errado, faz mal aos outros. nem mesmo na dor que sinto posso sentir algo direito, senão estou sendo culpada. não posso dizer que não aguento mais nada, que nada é mais gracioso, que não quero levantar. quero olhar o teto, ou fechar os olhos e dormir. adormecer nesse momento é a melhor coisa, porque dormindo se esquece de tudo. e, quando você acorda, por alguns segundos, você nem sabe quem é ou onde está.
quando entro no chuveiro, a água parece falar comigo, diz que quer lavar toda essa sujeira que não sai do meu corpo. eu esfrego dos cabelos até a ponta do pé, mas tudo permanece, é como se a minha sombra se impregnasse em mim e não soltasse nem mesmo na escuridão. é a liberdade sendo tomada em goles secos.
se eu pudesse, abraçaria a música que agora toca. agradeceria por me fazer sentir o que quer que seja, um ódio, rancor, amor? mas ela passa por mim sem nem mesmo deixar o silêncio no ar.
respiro em vão.

um quê de nada

era mais de meia-noite e a mulher já abotoava o vestido. o sexo tinha sido bom, o vinho, até a luz da lua tinha esclarecido alguns pensamentos nebulosos. agora, calçando os sapatos, lembrava com certa angústia que aquilo não passava de um corpo suado em outro corpo suado até o esquecimento da realidade. não que fosse romântica, não era, mas depois de tudo os olhos nem se encaravam, e quando se esbarravam eram claramente desviados para algum lugar mais interessante, quem sabe até um jarro de flores.
ela se preparava para ir com certa leveza e sem pressa. faltava alguma coisa, esperava que isso brotasse já que o olhar se preocupava mais em olhar rosas. pegou uma taça de vinho da cozinha, passou na frente dele, ficou apoiada no umbral.
- se incomoda se acendo um cigarro?
fez que não com a cabeça. agora estava deitado na cama, os olhos fechados, o corpo num relaxamento quase indizível. está tudo bem? ela gostaria que ele perguntasse. mas aquele cachorro não queria saber nem o nome dela, quanto mais o seu estado emocional. foda-se, também iria embora logo e nunca mais teria que olhar pra cara dele.
lembrou-se de umas cenas estranhas, talvez fosse o vinho fazendo efeito. a sua vó falando algo sobre o amor. o que é mesmo? ah, sim, que o amor é quando duas pessoas ficam juntas pra vida toda. tadinha da minha vó. se ela me visse agora teria morrido de novo. acho que eu queria um amor assim, que nem ela me disse, mas só pra provar no final que tudo não passa de uma farsa.
- ô carlos...
- hm?
- eu tô indo embora, viu? prazer em conhecê-lo.
- bate a porta quando sair, coisa linda.
bato, claro que bato, e bato na tua cara também. acendeu mais um cigarro, jogou o resto do vinho naquele chão limpinho e quebrou a taça acidentalmente do lado da cama.
tchau.

sábado, fevereiro 25, 2012

canção

não estou pedindo nada. nem um pedaço de fotografia nem um sorriso quente de um dia de verão. não quero fazer disso uma tragédia grega ou um daqueles filmes que guardo com carinho na minha instante. só quero ir, voar pra longe, onde o canto de ossanha seja enganado, onde eu possa ser um rabisco que se sente livre apenas por ser o que é: um pedacinho de formas e sentimentos que, mesmo feios e sem nexo, são também verdade e uma vida pralém da respiração.
cansei. não de te escrever textos que não são nunca lidos ou de te olhar sem perceber o tempo indo embora. mas de algo que não consegui ainda explicar para mim mesma, acho que é uma vontade (uma sede) de querer mais, de ultrapassar somente a pele à angústia, de encostar os dedos nos dedos e não haver ali uma única célula que não saiba seu lugar no universo.
se eu pudesse, te abraçaria, te colocaria junto à poesia que está batendo no meu peito, te daria um nome que prefiro agora não nomear. mas, dentro de toda essa loucura, dessa palpitação, desse pulso inconstante que me toma a goles longos, algo grita que é hora de fechar os olhos, acabou o conto, o poema partiu para pasárgada (ou para qualquer lugar onde possa ser chorado com calma e amor).
o fim não justifica o meio, pois o meio já é parte do fim. e eu sabia disso desde o começo (se é que houve algum), já sentia as cores escorrendo pelos meus dedos, como ondas entreabertas num poema da cecília meireles. eu queria dizer que não vejo o horizonte nem acho que o mar cai num buraco sem fim. mas que me deixei afogar dentro desse emaranhado de águas salgadas (de choro) e limpas (de um sentir sincero). agora é hora de respirar, de deixar a inundação transbordar do corpo para o mundo, como as notas fugidias do piano ao ser tocado levemente pela primeira vez.

quinta-feira, janeiro 26, 2012

1, 2 e 3

1. não sei que dia é hoje. 2012 começou me arrancando do tempo.
tenho transformado as lágrimas em cigarro, e o que deveria me deixar em paz entraz cada vez mais:
primeiro pela boca, depois pelos pulmões (o que me impede o grito e troca a angústia por um punhado de tosse).
olhei pelo umbral e vi um dia lindo. se eu jogasse todos os cigarros pela varanda e assobiasse a vida que está dentro de mim, talvez eu conseguisse transformas esses muros à minha volta em flores e poesia.

trago, me enveneno e fecho os olhos.


2. quando choro não é por meu amor ou cicatriz.
não.
é pelo mundo, pelas flores que morrem cedo, pelas secas lágrimas derramadas pelo nordeste.
joguei tudo fora, menos essa fagulha que ainda espirra fogo e cinzas em mim.
disse adeus às pílulas anestesiadoras, agentes futuras da cirurgia final: a de não sentir as explosões que matam e corroem tudo à nossa volta.

cheque-mate.


3. não, meu amor, a vida não é uma distração. é o pôr do sol nascendo nos olhos nossos, o perfume do mar caindo como chuva de verão nos corpos perto e longe da prainha.
sabe quando o vento vem? ele te deixa pedaços de ontem e planta sementes escondidas pelos poros que vão ser flores ou ramos luminosos um dia.
o jardim primavera é vida, apesar do que eu disse naquele dia bêbada. também é dor, mas é mais do que um cenário cheio de balas ácidas e olhos nas janelas. é um acordar, bocejar, cheirar o mundo, aveludar as mãos só para depois tirar as luvas e sentir as gotas do mar que chegou ali de qualquer forma.