domingo, fevereiro 25, 2007

O Trem.

É um trem imenso, por onde todos viajam. Sua plataforma é feita de vento, para que empurre os sentimentos rumo ao futuro. Possui somente cinco vagões, um para cada fase da vida e o último para a não-fase.

Ele pisou no primeiro vagão. O trem parecia ir devagar, as janelas estavam meio fechadas, e o ar entrava de leve. Tudo era mágico: o balançar, os trilhos soltando algumas faíscas, de vez em quando, e a música tocada por ninguém. Olhava por uma das janelas, e os trilhos pareciam não haver fim.
Ele via outros, debruçando-se pelas janelas e brincando e rodando e pulando. Dizia-se, por aí, que este era o mais bagunçado vagão de todos. E também o mais feliz. Ele não sabia se era, afinal, nunca visitara os outros. E não podia fazê-lo, até que um camareiro viesse entregar-lhe a chave para abrir a porta de ligação.

Ele pisou no segundo vagão. A sensação foi estranha. Achava que nunca receberia chave alguma. Mas, enfim, uma porta se abriu. Como este era diferente do primeiro! Umas garotas, que nunca havia reparado antes, piscavam para ele, e alguns de seus amiguinhos bebiam líquidos que os deixavam muito, muito felizes.
Ele sentia como se o trem houvesse disparado. Os trilhos e a paisagem passavam rápido. Ele nem conseguia ver as árvores direito. Começou a sentir uma pontada de saudade do primeiro vagão. E uma saudade dos seus antigos amigos que, agora, estavam tão diferentes do que já foram um dia.

Ele pisou no terceiro vagão. Sua cabeça doía. O trem andava mais rápido do que nunca! Nem chegava mais perto das janelas. Ora, para quê? Conhecia aquele cenário há muito, estava cansado de árvores, casas, trilhos, ah! Tudo se repetia, tudo. Seu coração fora partido e estava sozinho, sem vontade para nada.
Foi quando ele sentiu a vontade louca de voltar os vagões. De fugir para o primeiro, para sua lentidão. Mas não pôde voltar, a porta estava trancada para sempre. Começou a chorar. Estava sozinho, enjoado. Pensou em pular pela janela, mas resolveu sentar-se e esperar pelo que vinha pela frente. Nada poderia piorar.

Ele pisou no quarto vagão. Apaixonou-se por um lindo par de olhos cansados e tristes. Pena tê-la conhecido apenas no penúltimo vagão. Queria viver com ela para sempre! E viveu. Mas o último vagão estava chegando, e ele começou a temer. Afinal, o que vinha após o último? O último de tudo?
Passou a ver graça em tudo novamente, pois era o último vagão chegando! Sentou-se, com sua amada, em uma noite chuvosa, e fez juras de amor eterno. Sentiria sua falta, onde quer que fosse parar. Não é preciso citar o quão doloroso foi o adeus dos dois corações rubros e cheios de vida para oferecer.

Ele pisou no quinto vagão. Lembrou-se de tudo que havia passado até ali e chorou. Era tudo tão colorido, misturado, sereno...

Foi avisado que, na próxima estação, deixaria o trem para sempre.

E soltou. Sozinho, até desfazer-se inteiro e misturar-se com o vento. Perdeu os pensamentos, ou estes simplesmente deixaram-se perder.

Mas o trem continuou.

Sem parar. Sem parar. Sem parar.

Eternamente...

domingo, fevereiro 04, 2007

Algo além.

Eu luto porque preciso,
Porque, sem lutar, eu morro.
Entregar-me é fácil,
Mas a derrota vem logo após.

Se o mundo cair à minha volta,
Vou a reconstruí-lo.
Já que, se ele cair,
Eu caio para o inferno.

Viver não é difícil.
Difícil é não viver.
E, não vivendo,
A vida desfalece.

Por acabar, preciso surgir
Do meio de tantos pensamentos
E acabar com todos os sentimentos,
Que me apunhalam a cada respirar.