terça-feira, maio 20, 2014

esse sol que toca a aliança
e minhas mãos
é o mesmo sol que seca o nordeste
que faz na áfrica a fome ser mãe.

como posso lavar as mãos singelas
e pedir da miséria o divórcio
se o mundo é o altar dos meus irmãos?

sol,
que às vezes é ouro
outrora música e eclipse,
deixa o grito longe do deserto
pra nascer no caminho,
dando à luz meio mãe e meio filho,
- a aurora.
só canto o abraço
a perda
a poesia. 

o toque me engole a existência
o tempo parado no escuro
a noite silenciosa do adeus

a memória deixa passos no asfalto
se esconde atrás da porta entreaberta
mulher de costas nuas no porta-retrato.

mergulho no arpoador
suicídio do dia
parto doloroso da lua
queria jogar o cigarro pro alto
e viver do enigma ritmado.
ainda há tempo
de esconder as linhas da mão
de fugir do vício do amanhã
de acalmar a fera embaixo da cama.

correr muros de frases soltas
arrombar a casa descuidada
arrumar a bagunça da janela no verão.

subi no mundo e disse calma
que ainda tenho uns segundos
pra decidir se sou freira
puta ou cigana.

ainda há tempo
de cochilar o nunca mais
e desenhar o de repente.
passarinho, me traz qualquer coisa
uma música
um pio
uma frutinha
até um carinho

desses que beijam
e depois voam
desenhando no céu o horizonte
pingando no mar lágrimas de sol. 

deixa aqui tua pena
pra eu brincar de desenhar
pétalas de rosa
casca de laranja
e tudo que há de bom no mundo.
dizem que estou enveredando por caminhos tortos. que da vida não sei medir nem o início nem o fim. que perdi o trem das oito, que o trem das 9 quebrou em santa cruz e tive que ir andando pelos trilhos cantando o silêncio.
não tenho sapatos, por isso os pés queimam no sol e pedem consolo no frio que existe em alguns cantos do país. às vezes correm, depois cansam e choram pela nudez tão sóbria, tão quieta, tão exata. 
acordo e não há sonho que me desperte, não há relógio que me levite. é o arroz cru sem gosto aparente que como, claro e insosso como o hiatus que caiu em mim.
o que dizem também digo, mesmo sem dizer, sem nem mesmo sussurrar, mas quando a gente diz é como se já não tivesse pra onde correr. é como aceitar a missa no domingo e ajoelhar pra rezar até conseguir dar à luz um milagre vivo.
qualquer coisa 
te digo,
para que não parta.

invento desertos
roda-gigante
cachoeira sem queda.

escrevo uma epopeia
canto de pássaro sem rumo
histórias que nunca viveu
(nem viverá) .

te trago nas mãos as estrelas
amantes do tempo
para que desenhe
sem me partir
o universo em mim.

domingo, maio 04, 2014

canta todas as músicas
que não calará o pássaro rebelde
voando dentro de mim. 

pois os rios não são o bastante:
o oceano conhece mundos
derruba terras.

não há órgãos pulsantes
que amansem meu corpo
não há toque tão próximo
que acalme a ânsia.

pode correr pelo deserto
pode buscar os passos
que quando chegar
nem o eco da minha voz estará presente.