aqueles gritos demoraram a sair da minha casa, dos cômodos, do pozinho entre as teclas do meu computador. entraram como uma orquestra, para todos os lados, pela fresta da minha janela e me alcançaram no chão onde eu estava deitada.
acordei sobressaltada, por saber que me tomavam os ombros e sacudiam. eu me deixava tocar como o piano em que meus pés encostavam. mas naquela noite, com o barulho me arranhando, eu queria ser muda. fui até a rua, era madrugada e meus olhos também pesavam como se houvesse uma gota de orvalho pendurada em cada cílio.
havia faltado luz no bairro inteiro - os gritos eram feito chamas. a janela de frente à minha casa estava aberta e uma mulher chorava.
cada grito, que como uma sinfonia crescia e diminuia, me consumia mais e mais. comecei a sentir o corpo quente. joguei água, mas não adiantou, tudo estava em carne viva. desde o chão em que eu pisava até os olhos assustados e com uma ponta de sentimento se escondendo nas dobraduras do piscar.
pessoas na rua já sussurravam.
- acho que morreu alguém.
- nossa, não somos ninguém diante disso tudo, não é mesmo?
- é.
entrei. teimosia de querer se distrair da vida. já disse que não quero distrações: quero sentir. como escrevo agora parece que foi um fato comum em um dia quente e sem sorte. realmente foi, não minto.
mas tudo me fogia do controle:
grito, fogo, dor, água. grito, dor, água, fogo. grito, fogo, fogo, dor. grito, grito, grito... fogo, grito.
um homem morreu, meu deus, e agora? como aquela mulher vai olhar para o mundo? como se as coisas já são duras e há de se limpar a casa toda sexta-feira? como se os chinelos ainda estão ao lado da cama! e o vidro ainda está embaçado com o frio do inverno passado.
fui para o banheiro e apoiei a cabeça na parede, a mão no peito. meu coração gargalhava.
era medo? era dor? era culpa? era falta?
o piano da sala parecia tocar sozinho, as pessoas na rua continuavam a olhar, os braços na cintura, a cabeça balançando, um conforto religioso afagando-lhes o pensamento.
quero um abraço, que me digam que sentem muito, que lamentam o repentino. talvez assim eu consiga me distrair um pouco do inevitável, porque os sentidos já me deixaram.
voltei a dormir. os dias seguintes devagar e estagnados.
o que mais me angustia é que a janela aberta por toda aquela noite continua fechada e os gritos, calados.
renderam-se, tal como eu (deiticamente), ao tempo.
terça-feira, janeiro 26, 2010
segunda-feira, janeiro 04, 2010
"pra você eu digo..."
gostava de assoprar as bolinhas de sabão e ver como estouravam facilmente. sabia que era tão passageiro como uma viagem de ônibus até itacuruçá naquelas férias de verão.
a bolinha sobe, diz que não quer nada, sente o mundo por alguns segundos e...
às vezes tentava pegá-las com a mão, mas era muito difícil! escorregadias, espertas, medrosas. as bolhas de sabãos conseguiam ser mais sábias que a menina.
ela, sim, deixava-se agarrar. aliás, jogava-se nas presas ferozes com a coragem nos olhos fumegantes. abria os braços como quem diz me abraça forte never let me go.
também surgiam, com isso, as vontades de eternidade.
quero que isso não se acabe, não não, como poderia deixar de ser isso para ser aquilo, como? fica, fica, não se esvai, não se deixe voar pela brisa até misturar-se e deixar de ser algo senão ela mesma.
corria. o céu em seu rosto, estrelas penduradas em seus cabelos. precisava alcançar o depois e guardá-lo dentro do peito como um grito que não, não quer sair. fica, fica!
preciso tanto de você como é, estático e brilhante. luz que pisca, mas nunca acaba. desejo de estar aqui agora eu você.
com um sim: estourou a bolha e viu as gotinhas d'água caindo no chão.
com um não: continuou a olhar a bolha esperta, que subia colorida a tentar alcançar o céu e tornar-se arco-íris.
-fotografia-
às vezes prefiro um talvez.
a bolinha sobe, diz que não quer nada, sente o mundo por alguns segundos e...
às vezes tentava pegá-las com a mão, mas era muito difícil! escorregadias, espertas, medrosas. as bolhas de sabãos conseguiam ser mais sábias que a menina.
ela, sim, deixava-se agarrar. aliás, jogava-se nas presas ferozes com a coragem nos olhos fumegantes. abria os braços como quem diz me abraça forte never let me go.
também surgiam, com isso, as vontades de eternidade.
quero que isso não se acabe, não não, como poderia deixar de ser isso para ser aquilo, como? fica, fica, não se esvai, não se deixe voar pela brisa até misturar-se e deixar de ser algo senão ela mesma.
corria. o céu em seu rosto, estrelas penduradas em seus cabelos. precisava alcançar o depois e guardá-lo dentro do peito como um grito que não, não quer sair. fica, fica!
preciso tanto de você como é, estático e brilhante. luz que pisca, mas nunca acaba. desejo de estar aqui agora eu você.
com um sim: estourou a bolha e viu as gotinhas d'água caindo no chão.
com um não: continuou a olhar a bolha esperta, que subia colorida a tentar alcançar o céu e tornar-se arco-íris.
-fotografia-
às vezes prefiro um talvez.
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