quinta-feira, janeiro 26, 2012

1, 2 e 3

1. não sei que dia é hoje. 2012 começou me arrancando do tempo.
tenho transformado as lágrimas em cigarro, e o que deveria me deixar em paz entraz cada vez mais:
primeiro pela boca, depois pelos pulmões (o que me impede o grito e troca a angústia por um punhado de tosse).
olhei pelo umbral e vi um dia lindo. se eu jogasse todos os cigarros pela varanda e assobiasse a vida que está dentro de mim, talvez eu conseguisse transformas esses muros à minha volta em flores e poesia.

trago, me enveneno e fecho os olhos.


2. quando choro não é por meu amor ou cicatriz.
não.
é pelo mundo, pelas flores que morrem cedo, pelas secas lágrimas derramadas pelo nordeste.
joguei tudo fora, menos essa fagulha que ainda espirra fogo e cinzas em mim.
disse adeus às pílulas anestesiadoras, agentes futuras da cirurgia final: a de não sentir as explosões que matam e corroem tudo à nossa volta.

cheque-mate.


3. não, meu amor, a vida não é uma distração. é o pôr do sol nascendo nos olhos nossos, o perfume do mar caindo como chuva de verão nos corpos perto e longe da prainha.
sabe quando o vento vem? ele te deixa pedaços de ontem e planta sementes escondidas pelos poros que vão ser flores ou ramos luminosos um dia.
o jardim primavera é vida, apesar do que eu disse naquele dia bêbada. também é dor, mas é mais do que um cenário cheio de balas ácidas e olhos nas janelas. é um acordar, bocejar, cheirar o mundo, aveludar as mãos só para depois tirar as luvas e sentir as gotas do mar que chegou ali de qualquer forma.

2 comentários:

sandrine disse...

Mais um vigoroso conto de Priscila Blake, repleto de imagens e pensamentos estonteantes e arrebatadores. A narrativa divida formalmente em 3 momentos exprimem os três momentos do devaneio poético da angústia do sujeito ante o mundo que o penetra, através das percepções primordiais do sujeito em relação a tudo o que lhe afeta. Essas percepções que afetam o sujeito, marcando os três momentos são, na ordem da narrativa, o tempo, o mundo e a vida. A imagem do fumo coloca brilhantemente a angústia do tempo, o consumo do cigarro, é o consumo do próprio tempo desse sujeito angustiado. A imagem do choro demonstra a angústia do mundo em que esse sujeito está submerso, uma imagem combinada de liquidez e secura (as secas lágrimas do deserto), ambos dando corpo ao sentimento de absoluta perda que este mundo provoca no sujeito. Esse mundo é "essa fagulha que ainda espirra fogo e cinzas em mim". Mais que o tempo, o mundo é o locus que apresenta ainda mais claro a terrível imagem da morte (xeque-mate). E por fim, a vida é o movimento triunfante nesse ciclo de angústia do sujeito, recuperando-se dos destroços dos momentos anteriores, a partir da reflexão profunda de sua própria existência nesse terrível mas ainda belo mundo.

sandrine disse...

Mais um vigoroso conto de Priscila Blake, repleto de imagens e pensamentos estonteantes e arrebatadores. A narrativa divida formalmente em 3 momentos exprimem os três momentos do devaneio poético da angústia do sujeito ante o mundo que o penetra, através das percepções primordiais do sujeito em relação a tudo o que lhe afeta. Essas percepções que afetam o sujeito, marcando os três momentos são, na ordem da narrativa, o tempo, o mundo e a vida. A imagem do fumo coloca brilhantemente a angústia do tempo, o consumo do cigarro, é o consumo do próprio tempo desse sujeito angustiado. A imagem do choro demonstra a angústia do mundo em que esse sujeito está submerso, uma imagem combinada de liquidez e secura (as secas lágrimas do deserto), ambos dando corpo ao sentimento de absoluta perda que este mundo provoca no sujeito. Esse mundo é "essa fagulha que ainda espirra fogo e cinzas em mim". Mais que o tempo, o mundo é o locus que apresenta ainda mais claro a terrível imagem da morte (xeque-mate). E por fim, a vida é o movimento triunfante nesse ciclo de angústia do sujeito, recuperando-se dos destroços dos momentos anteriores, a partir da reflexão profunda de sua própria existência nesse terrível mas ainda belo mundo.