segunda-feira, fevereiro 26, 2018

dar à luz é sempre uma oferenda. a gente nasce já doando nosso grito, nossa solidão. sair da escuridão com um choro profundo de aceitação e destino. dar à luz é sempre pagar as contas para o futuro. aquele grito se repete depois com alguns cinco dez anos quando perdemos nossa avó. nascemos já abraçados com o trauma, e ele nos chama e nos exige, pode ter certeza.
por isso quando ando pelas árvores e vejo suas sombras e uso delas para me esconder de qualquer coisa, lembro que o grito está ecoando em suas folhas, em suas sementes. enquanto corro já nascem outras flores, enquanto danço já morrem outras flores. às vezes planto, às vezes pisoteio.
dizem que há milhares de formas de ver o mundo, para mim só existem duas: a de quem o vê sorrindo e a de quem o vê chorando. todo o resto são nuances que se encontram, se desfazem, se misturam em cores. sentar no abismo e ter a felicidade de quem está à beira; sentar no abismo e sentir-se o próprio abismo, e prceber que não existe beira, só queda.
há quem se jogue de paraquedas, quem amarre uma corda na ponta e desça devagar. estou entre os que se jogam de braços abertos e já não sabem quem são enquanto caem.

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