quarta-feira, março 11, 2009

ciclo momentâneo e vicioso.

Estava caminhando e o mundo me doía. As pessoas desfalecem, sofrem, sangram, enquanto dou mais um passo à minha casa. Cada pequena formiga é pisoteada por minhas células gigantes, por meus sentimentos miúdos. As bactérias sãos inspiradas para dentro de mim e, talvez, quem sabe, passem pelo meu coração devagar. Tumtum, tumtum... tum... tum... tum.
Eu nunca soube. Ou nunca quis saber. Não que isso me faça importância agora, rastros do passado distante. Entro em casa e jogo-me no sofá. Tenho medo, um medo egoísta de encarar qualquer coisa à minha volta. Por isso, bem sei, sou encarada. Tornei-me passiva, não sou mais agente dos meus atos. O controle remoto fixa seus botões em minha alma remota. Ele quer se mexer, gritar, implorar! Mas não pode. Ele não faz parte da crueldade da natureza. Não, nada disso se lhe é verdade. Enquanto eu, ah, eu desejo ser contida imediatamente, desejo não ter opções. Desejo não ter desejo.
Mas sinto-lhe pena e tudo volta à minha mente: a menina suja, por favor, dinheiropãoáguavida! Eu passei, mas uma parte de mim ficou parada ali para sempre, naquela dor tão completa... até ser consumida profundamente pelas pessoas que não se dividiram como eu (pessoas retas, certas, pessoas uma só). E aquilo me sugou. Como tudo que já me vinha sugando há anos, corroendo a essência que habita dentro de mim. Mas aquilo, aqueles olhos implorativos, aquelas minúsculas mãos cortadas, aquela alma que pede, obsequiosamente, que lhe dêem algum sentido!

Meu deus, estou chorando! E como choro pelo meu egoísmo, que foi transformado em medo. Não tenho coragem de pegar o controle remoto e ligar a televisão e deparar-me, ah, com o caos de sentimentos, de perda de fé, da realidade que tanto me abala! Como posso, como? Muito menos tenho acapacidade (força!) para comer, tomar banho ou dormir. Não sei como estou respirando. Não me consigo mover. Não, tudo que me lembro é do beco escuro e da menina e do cheiro e do sabor salgado. Sou incapaz de recordar mais. Talvez aquela senhora...
Não, por favor, não! Não me lembre de mais. Ah, mas eu sei. Eu estava cega e, por isso, conseguia ser feliz. Eu era como Tobias, meu cachorro que está brincando com a bolinha de borracha neste exato momento. O mundo é esse brinquedo, que pode ser mordido, rolado, chutado, ser feito pleno dentro de uma plenitude relativa. Não importa, o mundo é todo seu, e de mais ninguém. Ele rola atrás da bola... ladra, pula, lambe. Ah, Tobias!
Mas sou humana, e sou gritantemente culpada por sê-lo. Fingi ser inocente, quando tudo se passava em flash em volta da minha bola de borracha, soltando faíscas claras e queimantes em cima de mim.
O que eu sou, senão o símbolo maior da culpa? Do conformismo e da falta de coragem?

Tudo é falta, na situação em que me encontro. Agora, aqui, sentada e paciente, vejo com a visão real como minhas paredes estão descascando, como os pisos de madeira estão corroídos pelos cupins. A vontade de gritar é estridente e sobe à garganta.

Mas eu não grito. Sou muda. Vejo e escuto, mas não solto o que senti. Não expresso. Tenho a catarse, mas a epifania é só minha.
Egoísmo.

A visão de tudo aos poucos volta a clarear. Acalmo. Acalanto. Ligo o som e escuto a música leve que me faz ter vontade de dançar.
Canto.
Sou folha, pena e nuvem.

Tudo passa...
Esqueci.

Há algo para lembrar?

Fui dormir e acordei ansiosa com o final de semana que vinha pela frente.

menina, beco, dor, fome...?
vocábulos não inerentes ao livro da minha vida.

4 comentários:

Unknown disse...

Oi.
Eu.
Passei.
Aqui.
Viu?

Gostei do texto. :D

Anônimo disse...

Bom, eu falei tudo o que eu tinha que dizer. Espero que quando você se sentir culpada você leia tudo aquilo e aquilo faça algum sentido para você - porque aquelas palavras eram as palavras que eu devia ouvir quando eu estava na mesma situação que você tá agora. Não era o que eu queria ouvir, mas era o que eu devia...
"Mas sou humana, e sou gritantemente culpada por sê-lo. "
Você e suas culpas por motivos estranhos.
A anestesia não dura muito. A dor vem, a dor some, um prazer estranho vem... eu diria que é o processo de renascimento. De um "passar de fase", de uma oportunidade de melhora.
Você é maravilhosa. Mesmo quando tá anestesiada. Mesmo quando eu vejo você prestes a cometer um erro tão grande... e eu pareço estar vendo eu mesma no passado. E eu grito: "Não! Não faça isso!". Não faça isso.
Você me lembra tanto o meu passado... não faça isso. Você é maravilhosa demais para se desperdiçar.

Rodrigo; disse...

"Tenho medo, um medo egoísta de encarar qualquer coisa à minha volta."

seria insegurança?!

belo texto!
beijão ;@

j disse...

"Mas eu não grito. Sou muda. Vejo e escuto, mas não solto o que senti. Não expresso. Tenho a catarse, mas a epifania é só minha.
Egoísmo."

Grita sim. Escuto e percebo, grita sim. Expressa sim. Compreendo quanto são poucos os que se permitem a leitura do teu grito, e acho que isso é a agonia da tua escvrita. Escreve. Escreve que existimos os poucos a ler. E essa dor que escreve nos rasga e nos ri, disso vivo.