domingo, outubro 29, 2006

O Museu do Pecado.

Foi tal como um pesadelo. Eu, olhando o mundo, ao ermo, sem alma. Não me sentia, apesar de me ser. Queria andar, mas não conseguia. Queria falar, mas as palavras de minha boca não saiam. E eu só via uma multidão de pessoas olheiras, espreitando como urubus. Uns perguntavam: “Mas que diabos está acontecendo?” Outros, ainda, desmaiavam de tão horror que a cena proclamava. Ouvia choro de criança, ouvia gritos de mulheres exaltadas.
Sirenes tocavam. Policiais corriam. E eu ainda não sabia o que se passava. Meus olhos observavam tudo, desde a multidão até as obras de arte pintadas e esculpidas. Vi Picasso, Da Vinci e Portinari. Vi pessoas desesperadas, com medo e me olhando com ódio.
Nesse instante comecei a me recordar.
Era uma manhã tempestuosa. Minha esposa estava programando levar nossos dois filhos para um museu. Oh, como as crianças estavam alegres! Falavam até que planejavam ser pintores quando crescessem. Eu, como bom pai, escutava tudo com muita alegria.
E fomos nós para o museu. Chegamos, as crianças ficaram encantadas. Mas minha esposa, uma mulher bela e virtuosa, se via inquieta, impaciente. Pensei ter sido impressão minha, mas não o foi.
Ela disse que precisava usar o banheiro. Tudo bem. Eu fico com as crianças. Passam cinco, dez, trinta minutos. Nada dela voltar. Agora, quem estava impaciente era eu. Pego as crianças e vou até o corredor que leva aos banheiros. E é nessa hora, que meu desespero insano começa a fluir.
A raiva subiu a cabeça. Como?! Seu vestido vermelho e bem passado, agora, todo abarrotado misturado a um preto jovial e cheio de vida. Em meio a uma atraente mistura simétrica, viam-se os vinte dedos entrelaçados uns aos outros, com lábios em pleno toque. Não conseguia acreditar. Meus olhos, mefistofélicos, gritavam em dor, em arranque de alma. Então, o pecado surgiu em abraço.
As crianças nada entendiam, mas correram até a mãe, que ficou em estado simplório de basbaque. E pela última vez, vi aqueles olhos, em total tarjados e, quem diria, eram negros. Fui arrastando minha mão, bem lentamente, por dentro do paletó. E não mais pensei.
Fora Um.Dois.Três.Quatro.
E, agora, me vejo aqui. Num pecado insano, sem fim. O desespero em alcance. Minha alma suspira, pedindo o grande feito. Lembrava de tudo. Exatamente tudo. Agira por impulso, mas não havia arrependimento, nenhum pingo. Mas havia peso, tristeza, amargura. E os olhares assustados me causam medo e me tiram toda fé que um homem pode possuir. Eu sei o que deve ser feito.Ainda com a morte na mão, aproximo-a do meu crânio, tão desumanizado quanto Deus. E a lembrança da tarja preta, finalmente me abandona, no descansado e pecador museu do tudo e do nada.

Fora Um. Dois. Três. Quatro...E cinco.

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