segunda-feira, outubro 09, 2006

Os Cigarros, Nunca O Homem.

Todos os dias, quando passo por aquela rua, ele sempre está lá. Não importa se está chovendo ou se está fazendo o calor de queimar, que costuma sobrevoar o Rio de Janeiro. Ele sempre está lá, sentado, quase pedindo por algum tipo de socorro.
Sempre passava por alí, sem notá-lo. E como notaria? Ele vive como uma sombra, esperando uma mão com algumas notas verdes. Vende cigarros, de todas as marcas. Usa chinelos sujos, e parece se esconder, com medo de que alguém o note e o puxe para a rua.

Mas uma hora eu havia de reparar.

Estava voltando da escola, como faço todo meio-dia, e o vi. O olhar mais vazio que eu já presenciei em toda minha vida. Não parecia sentir o vento nem os raios solares, formados há algumas horas. Não parecia se importar com os pedestres apressados, esbarrando bruscamente em seus pés indefesos. Na verdade, não parecia importar-se com nada.
Aquele olhar de vivência perdida, de meia vida quase sem sentido, fez-me parar, estática, e sem forças, somente para sentir aquelas lágrimas, que pediam para sair há anos, mas, dele, nunca saiam. Parecia ser forte, mas se via toda sua fraqueza, apenas naqueles olhos.
Aqueles segundos, os quais passei sem respirar, voltaram ao seu tempo normal. Mexi a cabeça e tentei desprender meus segredos do olhar daquele senhor. Por que ninguém reparava? Era tão difícil dizer: "Bom dia! Como acordou hoje?". Ele sentia falta de tudo. De um sorriso amigo, de algo para fazer. Eu nunca havia conversado diretamente com sua pessoa, mas parecia que eu a conhecia há anos e que éramos como pai e filha.
Tentei pensar em maneiras de animar sua alma. Fiquei com uma idéia fixa na cabeça durante semanas: Dar-lhe um livro! A idéia era perfeita, a não ser, é claro, se ele não soubesse ler. Como eu faria? Fingia esquecê-lo na pequena bancada de cigarros? Não, não daria certo. Dá-lo-ia diretamente? Não seria uma boa idéia, se ele realmente não soubesse ler.
Ao final, resolvi-me não por livro, mas por música. Todos sabem escutar e aproveitam a música até nos dias piores. Comprei um radinho, daqueles de pilha, e tomei coragem para entregá-lo ao triste senhor.

- Com... com licença - disse, tentando não mostrar o nervosismo. - É que... eu comprei isso para o senhor...

Entreguei-lhe o radinho e ele o aceitou. Ficamos os dois parados, por alguns minutos. Eu e ele éramos o mundo, por tempo parado. Não agüentando mais toda a situação, ajeitei a mochila nas costas e resolvi ir-me.

- Bom, então já vou indo... faça bom proveito...

Já estava virando de costas, quando ele pegou na minha mão. Assustei-me, não esperava aquele tipo de reação de alguém que nunca havia mostrado sinal de emoção. Olhei diretamente em seus olhos e, quem diria, naquele instante, não vi vazio nem tristeza. Vi uma pequena lágrima escorrer por seu rosto e tocar os lábios ressecados. Olhava para mim com uma firmeza infinitamente sóbria.

- Você, de todas as mil pessoas que passam diariamente por aqui, foi a única que reparou em mim, sem motivos de fumo. - Abriu um sorriso, o mais lindo e sincero sorriso.

- Eu...

- Obrigado. - E desviou o olhar de mim.

Senti que o que havia de ser feito, já tinha sido feito. Soltei um enorme suspiro de alívio, ao escutar palavras vindo daquele senhor, que até hoje não sei o nome. Um homem que havia sido esquecido pela sociedade, e que vivia somente com as gotículas de poeira.
Balancei a cabeça em sinal de respeito, e fui-me embora.

Quando já estava longe do senhor, olhei para trás. Ele estava batendo os pés alegremente, ao ritmo da música, que ressoava em seus ouvidos.
E seus olhos sobrevoavam o céu azul, daquela linda tarde de verão.

4 comentários:

Anônimo disse...

Como as coisas mudam de outros pontos de vista,né.. ^^

Muito bom esse! =D~

Mas e a menina em...rotina,cenário sempre igual.Será que o senhor não devia dar algo a ela também ._.
Podiam ouvir a música juntos! =D

te amo pritzolenha

ja nee ^^

Anônimo disse...

que munitoooooo *____________*

ç_ç Lindo, preeca.

=* amo-te.

Anônimo disse...

Gostei.

;*

Anônimo disse...

ali em cima, sou eu