domingo, outubro 29, 2006

O Toque do Vento.

Ela não podia mais voltar. Não agora. Não depois de tudo vivenciado e perdido. Queria tanto ver após o muro. Aquele muro que, de tão vermelho, se via azul. A todo instante, sussurrava-se pelo vento: Por que o fiz? Por quê?!
Let it bleed. Nunca pensara em tornar uma música, literalmente, o sentido de suas ações tristes e finalizantes. E ela, agora, só conseguia ver aquele vermelho vivo, fluindo, pedindo por ajuda, com vontade de viver. E ele a acariciava, tão quente, tão temeroso e tão vermelho como tal, enquanto descia pelo seu peito frívolo e quase sem vida.
Lutava contra as lembranças. As lembranças que a açoitavam, mostrando-lhe o motivo de agora estar ao vermelho. Cada vez mais, se sentia só. Não entendia o porquê. Não existem porquês. Nem mesmo tais lembranças eram suficientes para esse pesadelo entrar em funcionamento.
Seus olhos. Esses olhos. Aqueles olhos que ardiam por ódio e rancor, agora, ardiam por medo. Um medo estranho e cruel. O medo do antecipado inevitável. Ah, como tanta coisa poderia ser feita! Mas não mais.
Sentia o mundo, o mundo que sempre observara capciosa e vagamente, caindo à sua volta, como uma pena que cai por leis. O vento batia forte em seu rosto, como se quisesse empurrá-la para longe, fazendo balançar seus cabelos longos, como facas finas e aguçadas. O cheiro de vida era tão bom, mas não o suficiente.
Não mais via nitidez nas coisas. A Lua dava voltas e voltas e seu coração batia acelerado. Apenas notava a dor. A dor de ter rancor, e saciar-se dele da forma mais errada possível. Nada, pensava, nada poderia justificar. Nem mesmo sonhos inalcançáveis ou egoísmos próprios. Nem mesmo qualquer loucura ou perda de sentido.
Ela sabia que estava chegando. O cheiro de vermelho estava tão, mas tão forte, que parecia que a tinha escapado completamente, sem deixar ao menos vestígios de dentro de si. Mas o medo nunca a deixaria em prol de físico. Não. O medo é tão mais sentido. Até seu último instante, ele a apavoraria.
O desespero chegara à porta. Seus dois faróis, que agora tinham água escorrendo como chuva, estavam se apagando. O medo crescia dentro de si, conforme a dor se espalhava e o vermelho a deixava. Seus sonhos, suas metas. Tudo indo embora. E agora chegava seu adeus para o medo com mais medo, que parecia que era impossível deixar de temer. E os faróis estavam a se apagar, lenta... Lentamente...

Mas ela não podia mais voltar. Não agora. Não depois do vento ter levado seu último suspiro para junto do eterno.

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